Comunidade escolar afirma que transformação da Escola Manaus de Porto Velho em Colégio Militar acaba sensação de insegurança
Para os alunos, a experiência nova se resume à sensação de liberdade e paz. Pois antes não tinham recreio. Pegavam o lanche e voltavam para a sala de aula.
– Qual sua opinião sobre a Escola Manaus ser transformada em Colégio Militar Tiradentes?
– Vem cá, ela vai ser militarizada, é?, questionou o motorista Ivanilson Montes, em tom de desaprovação.
– Ela terá um modelo similar ao Colégio Tiradentes, da avenida Migrantes. O que o senhor acha?
– Ah tá! Se é igual aquela será muito bom, não só para os alunos, mas para todos que moram nas proximidades também. Respondeu, enquanto sua esposa Fernanda Santos, estudante de psicologia, completava que a partir de agora iriam planejar transferir as duas filhas, uma de 9 e outra de 13 anos, para a nova Tiradentes porque fica mais próxima da residência deles.
A transformação da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio com EJA Manaus na Unidade VII do Colégio Tiradentes da Polícia Militar (CTPM) foi autorizada pelo governador Confúcio Moura pelo Decreto nº 22.135 publicado no dia 25 de julho, no Diário Oficial do Estado, que dá prazo de 90 dias para a Secretaria de Estado da Educação (Seduc) e o Comando Geral da Polícia Militar ou o do Corpo de Bombeiros Militar adotarem as medidas cabíveis para o funcionamento da instituição sob o novo regimento depois de 40 anos de fundação no bairro Mato Grosso, em Porto Velho.
Após a publicação do decreto, o capitão-bombeiro Sued Rocha, bacharel em direito com mestrado em administração pública, designado diretor, com o auxílio da então diretora, Mônica Franca, agora na função de vice-diretora e coordenadora pedagógica, além da tenente PM Cleíssa e outros oito militares, tomou como primeiras providências a adoção de guarda policial 24 horas por dia, inclusive nos finais de semana e feriados; e o fechamento dos portões laterais que facilitavam o acesso de outras pessoas para uso de forma ilícita da quadra e até de outras dependências, principalmente no período noturno e aos finais de semana.
“Não tínhamos sossego. Os bandidos invadiam tudo, e quando chegávamos no outro dia estava uma maior bagunça. Jogavam tudo nos corredores. Roubavam até o gás dos aparelhos de ar condicionado para fazer droga”, disse uma funcionária que trabalha há 19 anos na escola, sendo completada por outra que trabalha há 28 anos, informando que muitos dias não teve merenda porque tinham roubado os ingredientes. Ambas não quiseram ser identificadas com receio.
Conforme o capitão Rocha, na sexta-feira (28) houve a primeira reunião com os professores, um total de 20; e no sábado (29) com os pais dos alunos, quando foram repassadas as informações e dirimidas dúvidas. Já nessa segunda-feira (31) foram iniciadas as primeiras mudanças envolvendo os alunos em ato cívico com o canto do Hino Nacional. Atualmente são 518 alunos distribuídos nos três turnos, mas a proposta do diretor para 2018 é ampliar o número de vagas, porém, de forma gradativa para que não resulte na falta de merenda, já que se trabalha com base no censo escolar do ano anterior.
Além da segurança, os militares que formam o corpo de alunos são responsáveis pela ordem unida (formação habitual de marcha, de parada ou de reunião dos componentes de uma tropa, que observa as distâncias e os intervalos estabelecidos) e instruções de segurança e prevenção.
O diretor explicou que entre as adequações está a formalização do regime interno, com indicações sobre o fardamento, corte de cabelo, seguindo o que acontece nas duas unidades do Colégio Tiradentes instaladas em Porto Velho e no distrito de Jacy-Paraná, onde a concorrência por vagas é grande devido aos excelentes resultados obtidos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Por enquanto, segundo o capitão, a farda adotada é calça jeans e camisa branca sem estampa. Mas para o próximo ano busca-se uma forma de doação da farda similar à da unidade I.
“Deve-se ressaltar que temos um diferencial, pois enquanto as vagas da unidade I têm como preferência os filhos dos militares, as da nossa unidade têm como prioridade a comunidade”, observou o capitão-bombeiro, acrescentando que não haverá cobrança de taxa de mensalidade, mas o acesso se dará por meio de processo seletivo.
Ele ainda tranquilizou os alunos da Educação de Jovens de Adultos (EJA) afirmando que todos têm vaga garantida para os próximos dois anos, mas a tendência é que a partir de 2020 o colégio funcione apenas com o ensino fundamental e o médio regular a ser implantado.
“Para melhorarmos os resultados, temos por meta a formalização de convênios e parcerias para premiação dos alunos destaque com bolsas para cursos e intercâmbio fora do País, além de promover atividades extracurriculares recreativas e lúdicas”, adiantou o diretor, reforçando a intenção de aproximar mais a comunidade da escola com atrações, como feiras de cultura, taekwondo , entre outras, na quadra que antes não podia ser utilizada como forma de prevenção da direção anterior para evitar o contato dos alunos com aliciadores. “A situação era temerosa não só para os alunos, quanto também para os professores, diretores e demais funcionários, pois muitas vezes entravam pessoas alheia à escola chamando os alunos para fora da sala de aula, e os professores, com receio, não podiam fazer nada”, citou o capitão.
Para a professora Solange Lira, que leciona português há quatro anos na escola, o novo regime é uma iniciativa excelente porque tende a melhorar todo o entorno da escola. “Não tínhamos graves problemas com os nossos alunos. À exceção de alguns casos típicos da idade deles. Nosso problema era com os de fora, que entravam e nos deixavam à mercê, sem a mínima condição para dar uma boa aula, pois roubavam todo nosso material de apoio pedagógico. Agora podemos dar aula sossegados. Só o fato de chegarmos aqui hoje [segunda-feira] e ter todas as lâmpadas, já nos tranquiliza”, argumentou, mostrando a porta de presídio colocada na sala dos professores, outra medida da direção anterior para garantir mais segurança.
Com pouco mais de um ano dando aulas de educação física, o professor Emerson Souza lembrou que os alunos eram proibidos de ir para a quadra para não serem aliciados. “Era um ambiente totalmente inseguro. A diretora mandava construir o muro, e eles [os bandidos] derrubavam”, acentuou.
“Assumimos este cargo com uma nova esperança e gratidão para trabalharmos no sentido de garantir melhores condições de aula e segurança para os alunos, professores e os moradores da região”, reforçou o capitão Rocha, que por 17 anos atuou na formação de soldados no Exército e há 7 anos está no Corpo de Bombeiros Militar de Rondônia.
Para os alunos, a experiência nova se resume à sensação de liberdade e paz. Pois antes não tinham recreio. Pegavam o lanche e voltavam para a sala de aula. Nessa segunda-feira receberam do novo diretor a informação de que terão recreio a partir de agora.
Outro morador da região que também aprovou o novo modelo, foi o ex-aluno da escola, hoje acadêmico de pedagogia, Andrey Garcia, 19 anos. Ele trabalha no comércio que o pai montou há 17 anos na esquina da escola, e disse que a sensação de insegurança era constante não só na escola. “Muitas vezes a direção chamava a polícia, e os bandidos sumiam. Mas quando a polícia saía, eles voltavam. Agora ficará mais tranquilo tanto para quem está na escola quanto para os vizinhos ”, afirmou.
Em 2014, a Escola Manaus passou por reforma após ter suas instalações depredadas no início do ano por vândalos que roubaram e incendiaram uma sala de aula. Neste ano, ainda conforme o capitão-bombeiro Rocha, estão sendo feitas adequações, incluindo construção do muro, telhado de uma sala destruído por um vendaval e a pintura do muro com a nova nomenclatura.
Ainda pelo decreto, caberá à Seduc e à Secretaria de Estado da Segurança Pública, Defesa e Cidadania (Sesdec) prover o Colégio Militar de recursos financeiros, patrimoniais e humanos dentre os profissionais da educação integrantes do corpo docente, técnicos, auxiliares e outros recursos humanos, garantindo o seu bom funcionamento.