A vitória consagradora da oposição na Argentina, superando até as previsões mais otimistas à esquerda e pessimistas à direita, mostra um ‘fadiga de material’, um cansaço acelerado do ideário da extrema-direita, no Brasil representado por Bolsonaro.
Não há dúvida de que o retorno de um governo com viés de esquerda na Argentina terá forte influência em toda América Latina, podendo representar o início de um novo ciclo de governos mais à esquerda do espectro político. É o chamado “Efeito Orloff: Eu sou você amanhã”, oriundo de uma notória propaganda do final da década de 80, sobre algo que pode se repetir, amanhã.
Na política é raro algo como a geração espontânea, logo, torna-se necessário construir alternativas concretas e os governadores do Nordeste, chamados por Bolsonaro ‘de Paraíbas’, estão dando exemplo: no último dia 29 de julho eles fizeram o lançamento do "Consórcio Nordeste", uma união entre os gestores nordestinos, para enfrentar a política discriminatória do governo federal em relação à Região.
No campo político torna-se imprescindível superar as divergências eleitorais recentes dentro da esquerda, não sendo salutar neste momento buscar descobrir quem errou menos nas últimas eleições, é preciso apontar na direção da unidade de ação de toda esquerda ou o povo continuará sendo massacrado em seus direitos e interesses.
Uma fala da Cristina Kirchner de antes da eleição, em especial, merece profunda reflexão da esquerda brasileira: “A situação do povo e do país é dramática e estou convencida que esta é a melhor fórmula, que expressa o que a Argentina precisa neste momento para unir os mais amplos setores políticos e sociais”. É urgente se inspirar nos governadores do Nordeste e em Cristina, para criar um “Consórcio Esquerda”.
O liberalismo exacerbado está maltratando o povo, com duros ataques aos direitos previdenciários e trabalhistas, sucateamento da educação, da saúde, da entrega de remédios, com a caçada sem trégua do “pente fino” do INSS, perseguição virulenta aos sindicatos, desmantelamento de conselhos com sociedade e da rede proteção social... – ou seja, retrocessos generalizados.
O momento pode ser propício ao debate com a sociedade, especialmente os trabalhadores e os mais pobres, sobre a necessidade de uma maior proteção social, a valorização do salário mínimo, manutenção/retorno de direitos trabalhistas e previdenciários, fim do teto dos gastos com educação e saúde, geração de empregos, dentre muitos outros.
É necessário ignorar o linguajar chulo e desqualificado do presidente, suas declarações polêmicas e sua pregação (falso)moralista. Isso não resolve os problemas dramáticos da população e serve apenas de “cortina de fumaça” para escamotear o debate sério sobre a retirada de direitos, redução dos investimentos, o desemprego e a crise econômica. É melhor não dar ‘bola’ para afirmações presidenciais como “cocô”, “troca-troca” e outras baboseiras do gênero.
*Itamar Ferreira é bancário, dirigente sindical, formada em administração de empresas e advogado.