MPF, MP, DPU e DPE processam Estado e União por ausência de tratamento cardiopático em Rondônia
A ação aponta que a regulamentação da Portaria, que proíbe o atendimento de situações emergenciais pelo CNRAC, ignora as desigualdades regionais identificadas pelo próprio Ministério da Saúde.
O Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Estado de Rondônia (MP/RO), junto às Defensorias Públicas da União e do Estado, ajuizaram ação civil pública com pedido de liminar para que a União Federal e o Estado de Rondônia suspendam, de imediato, em relação à Rondônia, os efeitos do artigo 11 da Portaria do Ministério da Saúde, que proíbe a solicitação de procedimentos médicos de urgência e emergência de pacientes estaduais para o Centro Nacional de Regulação de Alta Complexidade (CNRAC), órgão responsável por atendimentos complexos.
A ação aponta que a regulamentação da Portaria, que proíbe o atendimento de situações emergenciais pelo CNRAC, ignora as desigualdades regionais identificadas pelo próprio Ministério da Saúde. Como a Região Norte possui pouca oferta do serviço especializado de cirurgia cardiopediátrica aos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), os pacientes ficam impedidos de ter acesso a esse serviço – gerando um índice alto de mortalidade. Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde, a doença está relacionada a uma malformação na estrutura do coração, existente desde o nascimento.
Outra medida em caráter de urgência é para que a Justiça determine ao Estado que disponha da infraestrutura adequada para o tratamento de pacientes com a doença. Além disto, aos usuários do SUS, especialmente crianças recém-nascidas, deve ser assegurada a possibilidade de avaliação por médico da especialidade de cardiologia pediátrica, para a realização dos procedimentos cirúrgicos necessários de acordo com cada caso.
Providências como contratação de recursos humanos (contratação temporária, convênio com outras instituições públicas ou privadas, termo de cooperação etc.), mesmo que com a contratação de serviços terceirizados da rede privada de saúde (ainda que de fora de Rondônia) também devem ser adotadas, enquanto o estado não possuir estrutura própria para atendimento. A resposta aos questionamentos do MPF deve acontecer em até 72 horas.
Violação ao direito – Devido ao descaso, o MPF constatou, após investigações, que desde 2015 crianças cardiopatas recém-nascidas vêm falecendo sem antes serem submetidas ao procedimento cirúrgico ou mesmo terem sido atendidas por profissionais da especialidade, já que em Rondônia o procedimento cirúrgico de cardiopediatria não está disponível.
Questionada pelo MPF, a Secretaria de Estado de Saúde de Rondônia (Sesau) informou que o estado não tem profissional cirurgião cardiopediatra e as solicitações de cirurgias cardíacas são cadastradas em um sistema nacional e reguladas pelo Ministério da Saúde por meio da Central Nacional de Regulação de Alta Complexidade (CNRAC), não existindo uma cota estabelecida para cada Estado, sendo os pacientes agendados de acordo com a ordem cronológica de solicitação, classificação de risco e disponibilidade de vagas nas unidades executantes fora do estado.
De fato, a ação mostra que toda demanda de cirurgias cardíacas pediátricas em Rondônia é transferida para outros hospitais no Brasil que possuam infraestrutura e equipe de profissionais qualificados por meio de Tratamento Fora Domicílio (TDF). No entanto, o MPF verificou a existência de questões como a demora para conseguir a autorização do órgão responsável pelo atendimento em outra unidade da federação, e a negligência quanto às famílias que esperam pelo atendimento especializado – questões essas que poderiam ser evitadas se o estado disponibilizasse o profissional habilitado e estrutura adequada para realização das cirurgias.
O procurador da República Raphael Bevilaqua evidencia na ação que, “na prática, o que se percebe é uma dupla violação ao direito de acesso à saúde por parte dos Poderes Públicos Federal e Estadual. A primeira afronta ocorre quando a União e o Estado não implementam infraestrutura adequada para o serviço de saúde atender a comunidade local, em Rondônia. A segunda violação se dá quando os réus fingem oportunizar, por meio do TFD e via CNRAC, o acesso universal à saúde a todos os cidadãos, deixando várias crianças sem o mais básico direito (a vida) e suas famílias destroçadas psicologicamente”.
Portanto, fica claro que o artigo 11 fere o mandamento constitucional de acesso universal igualitário. O MPF, MP/RO, DPU e DPE entendem que esse procedimento de encaminhamento adotado pelo Estado e pela União é ineficiente, uma vez que a falta de atendimento, em tempo hábil, tem causado a morte de pacientes.