Educação a distância e aulas remotas: elementos técnico-pedagógicos
Para efeito didático estaremos neste texto fazendo um trabalho por tópicos, ou aforismos técnicos pedagógicos acerca do tema. Também pelo mesmo motivo as referências estarão em forma de notas.
Para efeito didático estaremos neste texto fazendo um trabalho por tópicos, ou aforismos técnicos pedagógicos acerca do tema. Também pelo mesmo motivo as referências estarão em forma de notas. O objetivo deste texto é explicitar as diferenças técnicas e pedagógicas da EaD e das Aulas Remotas, assim como seu impacto nos processos de gestão, formação e práticas docentes.
Sobre a necessidade das aulas remotas
No final de 2019 e com maior amplitude em 2020 surge uma situação epidêmica na China, província de Wuhan decorrente do novo coronavírus, chamado de COVID-19. No Brasil é feito o acompanhamento do avanço desta doença que causou efeitos desastrosos em outros países até o momento em que a mesma chega ao país. No dia primeiro de maio de 2020 o Brasil registra mais de 85 mil casos (sendo 502 casos no Estado de Rondônia e 404 no Estado do Acre) e 5.901 mortos (1). Devido as questões sociais, políticas e econômicas há grande inconsistência acerca dos rumos que deverão ser tomados pela sociedade. A partir deste cenário o Ministério da Educação publica a Portaria 343/2020 autorizando a utilização das tecnologias de informação e comunicação (TICs) nas disciplinas presenciais durante a situação da pandemia. Decretos estaduais acompanham restrições e isolamentos sociais – e constantemente reeditados a cada aumento da curva de contaminação.
Das reorganizações institucionais
Da mesma forma que demais setores produtivos (pois a educação se encaixa ao modelo produtivo quer seja na ação em si ou na formação de novos trabalhadores e cidadãos) o setor educacional foi pego de surpresa pela situação do COVID-19 e as instituições de ensino de todos os níveis necessitaram se reorganizar, se reinventar e buscar alternativas emergenciais para que o foco no ensino e aprendizagem tenha um impacto menor na classe estudantil. Há então uma mobilização pedagógica e necessidade de readaptação de gestores, técnicos e docentes para o novo cenário que envolve: utilização de TICs para a educação, realojamento prático do uso das redes sociais para fins educativos, repensar a aproximação com o aluno e os meios de garantir o ensino e a aprendizagem, dispor meios tecnológicos para docentes (e posteriormente alunos, quando a instituição possui tal ferramenta) para que seja aplicado o modelo remoto, dentre outras ações.
Prática e formação docente
Na teoria da educação já é debatido, e não faz pouco tempo, a inserção da tecnologia como auxiliar do processo de ensino. Que até então era apresentado como um dos maiores desafios na sua aplicabilidade e constituição dos recursos tecnológicos de forma positiva em seu uso pedagógico. Assim como em outros setores produtivos há uma transformação contínua dos processos e uma reinvenção para as novas formas de trabalho. Na educação temos percebido isto enquanto a entrada da utilização de tecnologias no processo de ensino e aprendizagem. Precisamos compreender, para o bem ou para o mal, que os novos modelos produtivos caminham para o amplo uso da tecnologia e formando nossos alunos para o binômio vida laboral/social (2) não poderíamos exclui-lo de tal importante competência. O mesmo ocorre com o professor: há uma necessidade de formação profissional para compreender e atuar em novo cenário. Várias instituições de ensino passam a preconizar formações neste sentido quer seja em suas semanas pedagógicas ou estimulando o discurso para a formação livre. Na prática, mesmo os professores presenciais usam de tecnologias em sua sala de aula, tanto pela questão do aprendizado em si como pelo próprio perfil do aluno de hoje, muito mais conectado as redes sociais e movimentos globalizados.
Educação a distância (EAD)
No Brasil em 1996 foi criada a SEED, Secretaria de Educação a Distância, com intuito de ampliar as discussões e projetos para tal modalidade de ensino. Contando com elementos regulatórios próprios, pois a mesma se desenvolve de forma diferente do modelo presencial, a EAD está presente na LDB/1996 em vários artigos que versam sobre formação continuada de professores, atendimento a jovens e adultos, ação de forma complementar na educação dos primeiros ciclos e ensino médio, dentre outras presenças. Importante frisar que a EAD tem como principais características o atendimento de um grande grupo de alunos por um número menor de profissionais envolvidos, com transmissão de conteúdos e atendimento por tutores, a diferenciação de professor conteudista e ministrante, tendo uma menor impessoalidade no processo.
Aulas remotas
As chamadas aulas remotas se associam ao contexto da pandemia do COVID-19 e dos documentos do MEC e decretos estaduais a qual acompanham as decisões dos Conselhos Estaduais e Federais de Educação. As mesmas, devido ao isolamento necessário, se concretizam por meio de tecnologias educacionais. Várias empresas liberaram gratuitamente artigos, livros, ambientes para conferências com até 150 pessoas visando facilitar este e outros processos. As aulas remotas apontam uma reorganização do campo educacional ou mesmo o apressamento de tal reorganização. O Conselho Nacional de Educação endossa nossa reflexão ao afirmar “Neste sentido, a fim de garantir atendimento escolar essencial, propõe-se, excepcionalmente, a adoção de atividades pedagógicas não presenciais a serem desenvolvidas com os estudantes enquanto persistirem restrições sanitárias para presença completa dos estudantes nos ambientes escolares” (3).
EAD e Aulas Remotas são a mesma coisa?
Diferentemente do EAD as aulas remotas possuem outras características: os professores atendem os alunos na mesma proporção que faziam antes da pandemia (ou até mais) e não a um grande grupo de alunos de maneira presencial, as atividades, avaliações e devolutiva quanto ao aprendizado são feitas para o grupo específico de alunos, assim não há redução de trabalho docente (e por consequência de remuneração do mesmo), o professor atende ao aluno individualmente nas demandas técnicas e pedagógicas. O que lemos nas redes sociais, em coletivos educacionais e ouvimos de nossos colegas é que as aulas remotas exigem muito do professor e mesmo em situação de medo causado pelas pandemias estes continuam a atuar com suas posturas profissionais junto a seus alunos no que tange ao cuidado para com seu desenvolvimento. Logo, as falácias de que em plena pandemia estão os professores aplicando o modelo EAD são discursos de quem não diferencia uso de tecnologias na educação da própria EAD. Por conta da questão epidemiológica estamos usando a tecnologia, mas o atendimento ao aluno é individualizado, organizado por turmas e horários: a prática docente se reestrutura no modo e em uma readaptação em um curto espaço de tempo, mas na essência (e esforço intelectual) continua a mesma.
Alguns dados para interpretação
Segundo o Censo do Ensino Superior no Brasil (3) temos 173.868 do ensino superior na rede pública e 210.606 na rede privada. Fala ainda: “A participação de docentes com doutorado, tanto na rede pública quanto na rede privada continua crescendo. A participação dos que têm até especialização cai a cada ano nas duas redes” apresentando um aumento da formação docente para atuação no magistério superior. Nas instituições privadas 48,0% dos docentes possuem a formação de mestre. Já na educação básica privada temos
A questão social
Os dados acima demonstram que parte considerável dos professores do Brasil se encontra na rede privada. Quem está fora dos muros destas escolas tende a apontar críticas, partindo sempre da lógica do mercado ou da crítica social – não estamos aqui desmerecendo tais análises. Entretanto temos aqui um grande número de profissionais da educação e pesquisadores que possuem carreiras e sustentam suas famílias neste contexto. Milhões de brasileiros estão ligados a estas instituições e todos estão vivendo igualmente o cenário da pandemia. Sabemos e desejamos estar de volta com nossos alunos (quem é professor sabe) mas é preciso ter cuidado com a saúde destas pessoas que são o futuro da nação. É preciso diálogo entre todas as instituições envolvidas no processo (famílias, sindicatos, gestores e outros) para que possamos manter o sustento e o aprendizado, apontando o que é melhor para nós. Não é desejado que instituições externas, sem ouvir amplamente a todos, decidam. Sabemos que nossos alunos nos reconhecem, eu sei que estão com dificuldades, muitos professores estão também. É preciso encontrar um meio termo protetivo para todas as variáveis envolvidas. O mundo está em momento crítico e acreditamos que o diálogo é o caminho que melhorará este cenário.
Vamos pensar a escola particular
No contexto de construção do ano letivo, o MEC aponta que as escolas privadas devem oferecer o serviço na sua totalidade (um ano letivo com no mínimo 800 horas divididas em 200 dias letivos) (PORTARIA nº 25, 13 DE AGOSTO DE 2015). Ou seja, independente da situação atual e das necessidades de momentaneamente ser adotada as aulas remotas, a rede particular de ensino devera – por contrato – entregar aos alunos a quantidade de horas e dias letivos previstos por lei. Bem nessa leitura inicial, as escolas particulares são obrigadas a definir um valor fixo anual de seus serviços educacionais. Como aponta a lei 9.870/09 – A escola não recebe em si uma mensalidade, e sim uma anuidade que é definida por contratas divididas em parcelas.
Vamos pensar a escola particular 2
As escolas na qual colegas de profissão lecionam, em sua totalidade estão mantendo seus funcionários (claro que não apenas me refiro a categoria de professor), pois muitos tiram seu sustento e de seus familiares a partir dessa atividade, e que muitas vezes sentem a mesma aflição de outros profissionais do campo produtivo (principalmente a questão da manutenção de seus compromissos em dia). E com isso se viram na necessidade de uma reinvenção pedagógica e transformaram suas casas em pequenos estúdios, e buscaram aprender o uso de novas tecnologias e o mais importante, manter o foco do alunado, em resumo se adaptando a nova liquidez (como falava o velho Bauman) na relação professor/aluno.
Uma nova maneira de se fazer educação
As tecnologias de informação sempre estiveram presentes em nosso cotidiano, seja pela proximidade com quem esta longe, seja ela como ferramenta de elemento educacional. Algumas plataformas de ensino (sejam elas voltadas para pré-vestibular e ENEM) já disponibilizam recursos educacionais em seus canais de ensino. Porém o maior desafio do docente estava no uso pedagógico das ferramentas. Um fator interessante que aconteceu nessa liquidez atual é a reinvenção do professor (sim, o Professor foi um dos mais impactados). A busca por novas ferramentas educacionais trouxeram a quebra de um paradigma para a classe educacional (podcasts, vídeo aulas, classes on-line, salas de conferências, grupos de estudos em plataformas, e principalmente atendimentos remotos aos alunos em qualquer hora de dia).
As aulas remotas, o aluno e o cotidiano
As aulas continuam acontecendo, a escola não parou, a escola se reinventou... E nesse contexto atual, a grande preocupação do professor e da escola é o atendimento de um número significativo de seu público, ao mesmo tempo, se debate uma readequação de calendário, conteúdos, práticas de ensino para um retorno as atividades presenciais. A grande preocupação hoje da escola nesse tempo de distanciamento, é o de manter o foco no ensino, o de não trazer um sentimento no alunado de que eles não estão sós, e que o profissional professor está ali, se reinventando e buscando cada vez mais exercer a mais nobre das profissões.
Rafael Ademir Oliveira de Andrade
Sociólogo, Mestre em Educação e Professor.
Luciney Araújo Leitão
Sociológo, Professor e membro do LEEHAp/UFAC
Artigo 1º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira de 1996. A LDB é a “lei maior” da educação brasileira, todos as ações de regulação educacional partem dela.