Não é razoável a tentativa do governo do Estado de atribuir à população e a governos anteriores a responsabilidade por sua própria inércia. “Esse é o limite do limite” – diz nota da Sesau para informar que, em Porto Velho, a taxa de ocupação dos leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) é de 95,9%. A Sesau tenta, agora, transferir para a sociedade a responsabilidade: “Temos pedido apoio da população e ainda assim, infelizmente, observamos que tem muita gente não seguindo as recomendações” – afirma, como que para imputar ao enfermo a culpa pela morbidade.
Chega a ser surpreendente como o bom senso tem sido sistematicamente desconsiderado na condução do enfrentamento da crise. Se o isolamento tem como um dos objetivos retardar o pico da contaminação para permitir o aparelhamento do setor público, como adotar protocolos de reativação da atividade econômica no momento em que o próprio Estado admite o esgotamento do sistema? Aliás sem perspectiva de previsão de novos leitos e decréscimo de novos casos. Como adotar protocolos para aliviar o desespero pré-falimentar dos empresários e o desemprego, que instala o espectro da fome no seio de tantas famílias, sem dialogar com todos os setores da sociedade? Os empresários rondonienses foram sumariamente ignorados na tomada de decisões e agora se veem sem perspectiva de voltar a funcionar, impedindo-os de gerar renda e riquezas, assim como colocando em risco concreto milhares de postos de empregos criados com muita dificuldade. A sociedade rondoniense se vê sem perspectiva de retomar sua vida no “novo normal”, a exemplo do que ocorreu em locais que atualmente começam a retomar suas atividades rotineiras.
O Estado não pode, porém, alegar desconhecimento do problema. Em documento datado de 23 de março, a OAB/RO oficiou o governo apontando medidas para o enfrentamento da pandemia que, então, apenas se anunciava por aqui. Foi ressaltada a necessidade de instalar um hospital de campanha para enfrentar a fragilidade do sistema à qual o governo agora se refere. Naquele momento, conforme boletim distribuído pela própria Sesau em 25 de março, registrava-se apenas cinco casos e nenhum óbito. O governo ignorou.
A realidade mostrou nesta segunda-feira (01/06), mais de dois meses depois das sugestões elencadas pela OAB/RO, 5.172 infectados (3.495 em Porto Velho), com 159 mortes, conforme boletim da Agevisa. Isso sem considerar a subnotificação, problema existente desde o início da incidência da doença no Estado, ou seja, há mais de quatro meses, e que não foi sequer solucionado até o momento. Somente agora se anuncia a distribuição de testes para as prefeituras, contudo, ainda há deficiência na disponibilidade de cotonetes clínicos (Swab nasal) para coleta do material. Isso acontece porque o Estado age isoladamente e elabora protocolos sem o cuidado óbvio de ouvir os municípios nos quais os recursos materiais serão aplicados. Falta transparência e planejamento. Como mobilizar a população se o próprio governo adota medidas isoladas e contraditórias que desconsideram os municípios? Como anunciar a flexibilização do isolamento social sem convencer a sociedade da seriedade das providências para sua segurança?
O isolamento, atesta a OPAS/OMS, é a única forma de combater o avanço da contaminação de forma a oferecer às autoridades sanitárias tempo necessário para se aparelhar. Mas não foi adotada qualquer das providências apontadas pela OAB/RO. Houve tempo para ampliação do número de leitos de UTI, mas o governo responde com malabarismos políticos.
Não se pode admitir a substituição do recomendável isolamento pelo execrável alheamento. A ação governamental, na crise sanitária e econômica provocada pelo coronavírus, conduz a uma única e aterradora conclusão possível. Apesar dos modelos disponíveis de enfrentamento, como o adotado pelo governo de Minas, Rondônia parece optar por uma atitude extremamente questionável, que aponta na direção do caos que se instalou em Manaus e avança para o interior do Amazonas.