Atendendo aos pedidos do Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal determinou, em caráter urgente, que a União libere recursos para contratação de 15 brigadas com 30 brigadistas temporários cada (totalizando 450 brigadistas) para atuar junto à Superintendência do Ibama em Rondônia, no combate aos incêndios da região. As brigadas deverão contar com equipamentos de proteção individual (EPIs), duas viaturas e instrumentos de combate ao fogo.
A União pode, como medida alternativa, requisitar bombeiros militares de outros estados brasileiros, na mesma quantidade de agentes e de equipamentos, para atuação sob coordenação da Superintendência do Ibama em Rondônia.
Na decisão, a Justiça Federal também determinou o deslocamento de efetivo da Força Nacional de Segurança para garantir o patrulhamento do entorno das áreas onde ocorre o combate às queimadas, bem como a escolta dos agentes brigadistas, contribuindo com o Exército Brasileiro. A patrulha e a escolta devem ser realizadas nas áreas de incêndio nas fronteiras dos estados de Rondônia, Acre, Sul do Amazonas e Oeste do Mato Grosso, alcançando toda a área de atuação da Superintendência Regional do Ibama.
Outra determinação é que seja fornecido pelo menos um helicóptero equipado com dispersores de água, com tripulação treinada, pelo tempo suficiente para conter as queimadas e tirar Rondônia do estado crítico em que se encontra.
Uma audiência de conciliação será realizada em até 10 dias, com as partes (MPF, OAB e União) e órgãos públicos envolvidos no combate às queimadas (Ibama, ICMBio, Estado de Rondônia e Secretaria de Meio Ambiente do Estado), que poderão pedir ingresso na ação, além do Comando da 17ª Brigada de Infantaria e Selva, da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros estaduais.
A decisão da Justiça Federal em Rondônia foi encaminhada ao ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino, relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 743, que trata de medidas para o combate a incêndios florestais nos estados da Amazônia e do Pantanal. O ministro recentemente autorizou o governo federal a usar créditos extraordinários sem limitação da Lei de Responsabilidade Fiscal e sem cômputos para fins de tetos ou metas fiscais, bem como o uso de recursos contingenciados do Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-Fim da Polícia Federal (Funapol) do atual exercício para apuração e combate aos crimes ambientais relacionados e conexos incidentes na Amazônia e Pantanal.
Na ação, o MPF também pediu que a União seja condenada a pagar R$ 50 milhões a título de compensação pelos danos morais coletivos, a serem revertidos a ações de cunho ambiental, voltadas ao reflorestamento de áreas públicas desmatadas e atingidas pelos incêndios em Rondônia, assim como direcionadas à retomada de terras públicas federais irregularmente ocupadas por particulares em todo o estado. Esse pedido ainda será decidido pela Justiça Federal.
Medidas acanhadas
Na decisão consta que “não se ignora que o Governo do Estado tem noticiado a denominada Operação Temporã, fases I e II, através das quais estaria combatendo os incêndios criminosos nas unidades de conservação Parque Estadual de Guajará Mirim e Estação Ecológica Soldado da Borracha, objeto de invasões e queimadas, provavelmente como retaliação pela recente desintrusão [retirada de invasores] efetuada em cumprimento à decisão do Tribunal de Justiça de Rondônia. Todavia, essas medidas são muito acanhadas e até pouco convincentes, dado que em declarações recentes do próprio titular da pasta do meio ambiente em Rondônia, Marco Antônio Lagos, em vídeo que circulou em redes sociais e do qual o mesmo não negou a autoria, [o secretário] critica o governador pretérito que criara 11 Ucs [unidades de conservação], entre as quais as unidades em foco, extintas pelo atual governador e restabelecidas pelo Poder Judiciário, e que o governador atual é ligado ao agro e pretende desfazer unidades que segundo sua análise, não seriam necessárias. Afora a ação recente nessas duas unidades, o governador não deu qualquer depoimento contrário as queimadas e em defesa da população indefesa por tal situação dramática”.
Em outra parte da decisão, consta também que “já há quase três meses, sem a percepção de medidas por parte da União, e muito menos do Estado, de caráter extraordinário e emergencial, favorecendo a manutenção da condição de calamidade pública, e passando a sensação de isolamento e abandono. O Estado demonstra letargia e desinteresse em cobrar da União medidas de sua alçada para debelar a crise”.
Também foi mencionado na decisão que “os criminosos sentem-se tão seguros e à vontade para depredar a floresta em Rondônia, que recebem os brigadistas à bala, como divulgou recentemente a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, sobre situação ocorrida por ocasião de atendimento a um pedido de socorro do Povo Indígena Suruí.
Ponto de não-retorno
Só em Rondônia, em julho, foram observados 1.618 focos de queimadas, em agosto, 4.522 focos e apenas nos primeiros 15 dias de setembro foram registrados 1.532. A falta de chuvas e aumento da seca na região podem estar relacionadas à ação das queimadas e desmatamento, com efeitos no ciclo ambiental e climático. O rio Madeira registrou recentemente cota de 41 centímetros, o nível mais baixo desde que começaram as medições. Porto Velho e região (incluindo Lábrea e Humaitá, no Amazonas) estão no epicentro da poluição atmosférica extrema, registrando o pior índice de qualidade do ar do planeta, ao lado de Rio Branco (AC).
Na decisão, o juiz federal Dimis da Costa Braga manifestou preocupação com o cenário atual. “A Amazônia rondoniense - a prosseguir na toada que segue a lógica das queimadas e incêndios florestais – corre risco de sua total destruição e ingresso em uma situação de não-retorno. É nitidamente perceptível por qualquer pessoa que aqui resida ou tenha transitado nos últimos dois meses, uma situação de extrema insalubridade”. O juiz também cita os efeitos dessa situação, como o confinamento das pessoas em ambientes fechados, especialmente crianças e idosos, para evitar a exposição às partículas, a sobrecarga dos serviços de saúde, além do impacto no transporte aéreo prejudicado pelo cancelamento de voos pela falta de visibilidade provocada pela fumaça.