Cinco instituições públicas recomendaram aos organizadores da festa intitulada “Dopamina” que alterem o nome do evento e deem publicidade sobre a alteração, bem como divulguem os canais de comunicação disponíveis para denunciar abusos e violência contra a mulher (delegacia especializada, Ministério Público Estado e Rede de Enfrentamento à Violência contra a Mulher).
A casa noturna “Zuuk”, local do evento, também foi recomendada a não realizar ou divulgar a festa com o nome “Dopamina” e a difundir no espaço digital da casa noturna os canais de comunicação disponíveis para denunciar abusos e violência contra a mulher.
O Ministério Público Federal, a Defensoria Pública da União, o Conselho Estadual de Direitos Humanos de Rondônia, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Defensoria Pública do Estado de Rondônia deram prazo de 24 horas para que os organizadores do evento e a casa noturna se manifestem sobre o acatamento, ou não, da recomendação. A omissão de resposta no prazo estabelecido será considerada como recusa ao cumprimento da recomendação, o que pode originar a adoção de providências judiciais.
A recomendação se originou de uma reclamação feita no Ministério Público Federal, na qual a reclamante apresentou um folder da festa e alegou que haveria ali um trocadilho entre o nome 'dopamina' (substância produzida naturalmente pelo corpo humano cuja atuação se dá no controle do movimento, memória e sensação de prazer) e a ideia de 'dopar meninas', especialmente porque o folder enfatiza a divisão dos vocábulos 'dopa' e 'mina' com cores diferentes e explicitando seu duplo sentido.
Para os autores da recomendação, a publicidade da festa fere, ainda que indiretamente, a dignidade das mulheres, uma vez que insinua ou pode insinuar que as participantes devem ser drogadas, dopadas, alcoolizadas.
“Sabe-se que é cada vez mais recorrente registro de abusos praticados contra mulheres no ambiente universitário, especialmente após a utilização de artifícios para deixá-las inconscientes. Há estudos científicos e sociológicos sólidos sobre a existência de uma cultura do estupro, em que são consideradas normais e permitidas atitudes de ódio, menosprezo ou repulsa ao gênero feminino. Desta forma, esse tipo de sugestão (DopaMina) pode reforçar tal cultura, vulnerabilizando ainda mais a posição da mulher na sociedade”, alerta o procurador regional dos Direitos do Cidadão, Raphael Bevilaqua.
Na recomendação, os autores acrescentam que a cultura do estupro tem vários traços, como “culpabilização da vítima, objetificação sexual, trivialização do estupro, negação de estupros, recusa de reconhecer o dano causado por algumas formas de violência sexual ou alguma combinação entre esses comportamentos”.
As instituições também argumentam que é nociva e abusiva a publicidade discriminatória de qualquer natureza que incite a violência, aproveite-se da deficiência de julgamento, desrespeite valores ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa.
Na recomendação consta ainda que a 'Convenção de Belém do Pará', da qual o Brasil é signatário, considera violência contra a mulher qualquer ato ou conduta baseada no gênero que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada, compreendendo a violência física, sexual e psicológica, ocorrida no âmbito doméstico ou em qualquer relação interpessoal, bem como na comunidade ou mesmo e se perpetrada e tolerada pelo Poder Público.
Assinam a recomendação o procurador Raphael Bevilaqua; o defensor público geral do Estado, Marcus Edson de Lima; a defensora pública federal Andressa Santana Arce; o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Rodolfo Jacarandá; a defensora regional dos Direitos Humanos, Alana Rúbia Matinas D'Angioli Costa; e conselheiro Andre Vilas Boas Gonçalves, do Conselho Estadual de Direitos Humanos.